banner-noticias-_850-x-550-px_-_2_.webp
Texto escrito pelo professor Sérgio Machado Corrêa, da UERJ, especialista em poluição do ar.

Estima-se que diariamente o ser humano precisa de 1,5 kg de alimentos, 2,0 L de água e 15 kg de ar. Conseguimos sobreviver 5 semanas sem alimento, 5 dias sem água, mas experimente ficar 5 min sem respirar. Qual o valor do ar que respiramos?

A qualidade do ar é o resultado de inúmeros fatores, tais quais a meteorologia, a topografia e as fontes emissoras de poluentes, que podem ser naturais ou antropogênicas. Destas últimas temos as fontes móveis (veiculares) e as fixas (indústrias). 

Em geral o ar das grandes cidades tem sua qualidade deteriorada em função das inúmeras fontes poluidoras citadas, associada à baixa dispersão dos poluentes, que depende muito da topografia da região.

Recentemente a qualidade do ar de muitas cidades brasileiras foi agravada pelos problemas advindos da seca prolongada e os assustadores números de focos de incêndio, na sua maioria criminosos. Estamos vivendo uma expansão nas queimadas nas últimas décadas para a crescente demanda do “agro é pop”. Como pode ser visto no último artigo na Nature de nosso grupo de pesquisa (volume 621, páginas 318-323, 2013) a soja e a pecuária têm avançado na Amazônia nos últimos anos, assim como a cana de açúcar no Pantanal. 

Uma área nativa preservada tem inúmeras funções na natureza, regendo a biodiversidade, regulando o clima, sendo um repositório de água, dentre tantos serviços “invisíveis” para a humanidade. O fogo não nasce de forma espontânea nas áreas preservadas, quase exclusivamente ocorrendo pela ação humana. Em geral faz-se a derrubada de áreas preservadas antes da época da seca, com diversos objetivos: grilagem de terra, retirada de madeiras nobres, mineração e ampliação da agropecuária. Uma vez derrubada as áreas nativas, segue-se o período de seca, que então usa-se o fogo para a “limpeza”. 

Porém, em alguns anos de seca mais prolongada, os eventos perdem o rumo e ficam incontroláveis, com o fogo atingindo populações, propriedades, animais de criação e em especial áreas preservadas. A baixa umidade, calor e vento é a combinação que faz os produtos das queimadas, na forma gasosa e de partículas serem transportados por centenas a milhares de quilômetros de onde foi gerado.

O ar que respiramos como produtos deste triste enlace de eventos são moléculas nocivas à nossa saúde, tais como os óxidos de nitrogênio (NOx) que deixam nosso céu avermelhado, o monóxido de carbono (CO), diversos tipos de hidrocarbonetos de cadeia aberta e em especial os aromáticos, compostos orgânicos oxigenados tais como aldeídos, cetonas, ácidos carboxílicos, entre tantas outras espécies, na sua maioria tóxicas. Estes últimos, em geral estão associados ao material particulado (poeira), que dentro de seus poros podem conter os perigosos hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPA), com características carcinogênicas, mutagênicas e teratogênicas.
Neste cenário o que os químicos podem fazer como profissionais? Não temos competência para evitar as queimadas, mas podemos protestar como população com os políticos e governantes. Como profissionais podemos alertar para as consequências destes fenômenos, realizar estudos de monitoramento da qualidade do ar, estudos de impactos ambientais, previsão de cenários futuros, interagir com profissionais de biociências e correlacionar os poluentes no ar com os efeitos na saúde.

Tags